Recentemente Israel comemorou o ano novo e em breve ocorrerá o dia das expiações. Conectando esses dois, trago aqui um texto adaptado que havia escrito em meu blog em 2010.
É ano novo e o que percebo é que o Cristianismo tem esquecido o significado do tempo. Muito se fala em vestir branco, não andar para trás, colocar moeda debaixo do tapete, pular 7 ondas e outras coisas estranhas à bíblia. Acredita-se que esses rituais irão mudar a vida dos que praticarem tais atos. Enquanto isso a Bíblia ensina algo bem diferente.
Ao Israel sair do Egito, Deus ensina ao Seu povo que o tempo deveria ser contado em relação ao santuário. Haviam 7 grandes tempos sagrados em Israel. Páscoa, Pães asmos, Primícias, Pentecostes, Trombetas, Expiação e Tabernáculos (consultar aula 12). As duas últimas festas eram relacionadas ao ritual de passagem de um ano para outro. É importante lembrar que a contagem de dias e meses não era como o nosso atualmente. Mesmo celebrado no sétimo mês, o rito da expiação comemorava a passagem do povo de Israel de um ano para o outro. A mudança ocorria em dois planos: (1) o ciclo da agricultura estava encerrando com o outono - Israel está no hemisfério norte por isso agora é outono - e (2) os rituais do santuário eram encerrados com a sua purificação.
O santuário era purificado porque durante o período de um ano, os Israelitas poderiam pedir perdão de pecados através de uma oferta. O livro de Levíticos mostra que as impurezas de todo Israel era depositada no santuário. Mas no último dia litúrgico, o dia da expiação, a limpeza ocorria não só no arraial como no santuário.
O rito ocorria por causa das impurezas, pecados e transgressões em Israel. Deus é puro e santo e o povo deveria também ser puro e santo (Êx.19:6 e Lev. 19:2). Como Deus habitava no meio do povo (Êx.25:8), as doenças, impurezas físicas, e pecados contaminavam Sua casa. Mas essa contaminação era benéfica, pois tinha o objetivo de purificar, de remover a maldade do povo (Lev.5:18). Assim como um hospital está cheio de doenças, mas continua sendo o local de cura, o santuário de Deus era uma esponja que sugava as impurezas do Israelitas arrependidos.
O esquema funciona em duas etapas conforme explica Lev 16. Todos os dias as ofertas e sacrifícios ensinavam o israelita que o pecado traz morte. E mediante o arrependimento e confissão, o pecado era transferido para o santuário, através da oferta. A habitação de Deus era sujada por todo um ano e no último dia do ano ritual, ele era limpo. Era o dia das expiações, da remoção do pecado.
O texto de Lev. 16 e 23 explica que durante o ritual todo israelita deveria jejuar, vestir roupas simples e afligir suas almas, ou seja, examinar sua consciência e arrepender dos pecados. Confiantes nos méritos do sacrifício e da mediação do sacerdote, o israelita deveria esperar ao final do dia uma vida renovada. Seus pecados haviam sido removidos e sua culpa também.
A casa de Deus funcionava como um depósito de pecados, por mais estranho que isso pareça. Os Cristãos em sua compreensão da expiação enxergam em Is.53 essa mesma dinâmica. O texto afirma que o servo de Deus se tornou pecado para nos dá a paz (ver 2 Cor 5:21). Essa paradoxo e promessa é central ao ritual do ano novo divino.
Curiosamente, a tradição Judaica rabínica desenvolve a noção que o ano novo ocorre não no décimo dia do 7o. mês (Yom haKipurim), mas no primeiro dia do 7o mês. Mas de acordo com Lev 23 o primeiro dia do 7o. mês é o dia das trombetas (v.24). Não há nenhuma indicação na bíblia de qual o significado desse dia, mas tradições apontam para um dia de aviso do juízo vindouro, o dia das expiações no dia 10. Assim, pelo calendário litúrgico o dia de ano novo era após o dia 10 e não após às Trombetas. Ou, seguindo o calendário da agricultura, o ano começava na primavera com o mês de Abibe ou Nisã, o mês da Páscoa e da saída dos Israelitas