Na aula 6 (Betesda e literatura rabínica) há uma referência à vara de Moisés como instrumento simbólico do poder divino. Como explicar que em Êxodo os magos do Egito também realizam milagres à semelhança do que Arão fez sob a ordem de Deus?
Primeiramente acerca da vara de Moisés, ela serve como instrumento de ação divina principalmente nos episódios miraculosos antes da revelação pessoal de Deus no Sinai. Esses episódios são: as 10 pragas, a abertura do Mar de Juncos (em algumas traduções “mar Vermelho” – mais sobre isso no curso de Geografia bíblica), a água da rocha em Refidim e a luta dos Israelitas contra os Amalequitas. Depois disso, ela meio que some de cena e eventos sobrenaturais diminuem também. Objetos em si na Bíblia não possuem poder intrísico mas apenas quando em relação com Deus ou outra fonte sobrenatural. No mundo bíblico o mundo físico é afetado por ações de seres sobrenaturais. É aqui que entram os mágicos do Egito.
Conforme o livro de Êxodo por quatro vezes os magos do Egito conseguiram realizar algo semelhante ao que o Deus de Israel havia feito (7:11-12, 22; 8:3). Após as serpentes, as águas em sangue, e as rãs há uma divisão entre os Israelitas e os Egípcios. Até então parece que as pragas afetaram toda a terra do Egito (7:20,21; 8:5,6, 16). A partir da terceira praga, de piolhos, os magos não conseguem simular a ação do Deus de Israel e da quarta praga em diante, há uma separação entre a terra de Gósen, onde os Israelitas moravam, e o restante da terra do Egito (8:22,23; 9:6,7,26; 10:23; 11:7). Nas 7ª e 10ª pragas, da chuva de pedra e morte dos primogênitos, quaisquer que obedecessem o alerta de Moisés escaparia da destruição (9:19-21; 12:23).
As exceções são a 6ª praga (úlceras – “toda a terra do Egito” 9:9) e, possivelmente a 8ª praga, dos gafanhotos na terra (10:5 e 6). Digo possivelmente porque o v.5 diz que os gafanhotos destruiriam o restante que a saraivada de pedras não destruiu. E conforme 9:26 a terrá dos Israelitas não foi afetada por essa praga. Mesmo que os gafanhotos tenha comido a plantação dos Israelitas isso não afetoua longo prazo porque em breve eles saíram da terra e não dependeram da alimentação do Egito.
Assim, há uma progressão nas 10 pragas em relação a ação de Deus contra os Egípcios. Nos três primeiros sinais que são replicados pelos magos do Egito o Deus de Israel não se mostrara superior. As próximas pragas, no entanto, demonstram não só que o Deus de Israel é mais poderoso como demonstra que todos os Egípcios que acreditassem nEle seriam libertos (8ª e 10ª praga).
Então o que é deixado claro na narrativa do Êxodo é que forças sobrenaturais afetam a natureza, e que o Deus de Israel é superior a qualquer outra força sobrenatural. Sobre o poder dos magos do Egito nas primeiras pragas uma interpretação diz que os magos fizeram apenas uma aparência de serpentes com as forças do mal (engano) e não uma real transformação. O argumento para tal interpretação é que apenas Deus pode criar e não as forças do mal. Mas será isso verdade de acordo com a Bíblia?
Outro argumento é que os magos parecem replicar os que Deus havia feito mas não conseguiram remover a praga visto que o faraó pede sempre a Moisés para remover a aflição sobre o Egito. Ambas interpretações são especulações que presumem que as forças do mal são limitadas pelo Deus de Israel. No próximo texto elaboro sobre poderes sobrenaturais e sua influência sobre o mundo natural na Bíblia Hebraica, e no Novo Testamento.
O blog ligado ao Israel Institute of Biblical Studies do eteachergroup -http://israelbiblicalstudies.com/pt/course/jewish-background-new-testament/
Thursday, July 30, 2020
Friday, July 3, 2020
Aplicações de topônimos bíblicos
É legítimo fornecer aplicações alternativas de lugares bíblicos. Por exemplo, os Cristãos dão uma aplicação alternativa de "Israel" como a igreja Cristã (crentes messiânicos). Se assim for, qual será o significado para o “Egito”, “Tiro”, “Nínive”, “Efraim”, “Judá” (Israel moderno?)? Você tem uma opinião sobre isso?
Essa pergunta aborda duas suposições que alguém pode ter ao
ler a Bíblia. Ambas estão intimamente ligadas, como explicarei. O primeiro é
baseado na sua palavra "aplicação". Crentes Cristãos e Judeus pensam
que a Bíblia é a palavra de Deus e, portanto, suas palavras são eternamente
verdadeira. Assim, quando Deus falou aos Israelitas que deixaram o Egito,
acredita-se que Deus realmente falou à toda humanidade, ou pelo menos à todos
aqueles que se consideram povo de Deus (Israel). Essa ideia já está se encontra
em Deuteronômio 5:3, quando Moisés diz à segunda geração de Israelitas que Deus
falou à eles no mt. Sinai, quando historicamente não era esse o caso. “Não com
nossos pais o Senhor fez esse pacto, mas conosco, que hoje estamos todos
vivos.“ Os profetas ecoam esse entendimento de que os ensinamentos de Deus aos
Israelitas que deixaram o Egito (a Torá de Moisés) ainda eram válidos para eles
que viveram séculos depois. Os autores do Novo Testamento também adotam essa
visão (por exemplo, 1 Cor 10: 1-11; Hebreus 4: 1-2), como todos os crentes Judeus
e Cristãos.
Como o texto bíblico é antigo, condicionado pelo espaço e pelo tempo, é
imperativo transpor o significado antigo para o presente. Assumindo essa
perspectiva, o texto pode dizer X, mas na verdade pode significar A, B ou C,
dependendo não apenas do contexto original do autor, mas do leitor. Nesta
dinâmica complexa do relacionamento textual, as referências geográficas também
são transpostas. É uma mudança de espaço para um lugar. Um lugar é um espaço
ideal, construído por seres humanos, não natural. Ambos (lugar e espaço) são
reais, mas suas realidades são baseadas em fundamentos ontológicos distintos.
Tomemos por exemplo Jerusalém. Na sua dimensão espacial, é o nome de uma
cidade localizada nas montanhas a oeste do Mar Morto e a leste do Mar Mediterrâneo.
Na Bíblia Hebraica, quando Salomão constrói o Templo lá, torna-se o lugar onde
Deus habita. Jerusalém a partir de então está relacionada à idéia - lugar de
Deus. Como o trono de Deus está no céu (1 Rs 8), escritores judeus posteriores
se referirão a Jerusalém do céu e da terra (Ap 21: 1-2; Bab. Talmud Ta'anit
5a). Supondo que Deus estivesse presente na igreja, alguns cristãos
interpretaram Jerusalém e, finalmente, Israel como a congregação cristã, e a
igreja como o santuário. Essa transferência de significado é puramente
ideológica e não tem raízes na fisicalidade do espaço original das Escrituras.
Essa transferência de topônimos para a esfera de idaias avança quando os
lugares foram identificados com comportamento e grupos de pessoas. Esse
entendimento ético, em parte, se baseia na suposição de que o mundo está
dividido em dois grupos de pessoas, boas e más. Tomemos, por exemplo, o Egito.
Na Torá, esse país Africano é o espaço que serve de refúgio para Abrão e Jacó
em tempos de fome. Mas também se tornou um lugar de abuso quando os Israelitas
foram oprimidos pelo Faraó e seu governo. Como a leitura ética das Escrituras
tende a ter uma visão míope ou atomística da realidade, o que é enfatizado por
escritores posteriores é o caráter opressivo do Egito, não o hospitaleiro. A
fuga do Egito (Êxodo) tornou-se paradigmática para autores posteriores que se
referem a novos casos de opressão como um retorno ao Egito. Isaías aplica essa
noção à invasão Assíria da terra de Israel (Is 10: 24-26; 11:16; 52: 4) e o livro
do Apocalipse vê no Egito, como Babilônia, o futuro inimigo do povo de Deus (Ap
10). 16-17), embora não houvesse Babilônia como cidade real atacando o povo de
Deus no primeiro século da era comum. Por sua vez, a Babilônia do Apocalipse foi
interpretado por muitos Cristãos como como representando os poderes políticos
que perseguiam os Cristãos, como o Império Romano, os Muçulmanos, ou até outro
Cristãos que discordavam dos perseguidos.
Essa leitura ética e dicotômica das Escrituras é evidente na maneira
como os autores dos Manuscritos do Mar Morto interpretaram algumas profecias.
Em um comentário sobre Nahum, a queda de Nínive é entendida como a destruição
de um grupo de Judeus (Fariseus). No mesmo comentário sobre Nahum, Efraim é
identificado como aqueles que falam falsamente, e aplicado aos Israelitas
atuais que aos olhos do autor estavam ensinando falsidades. Esses Judeus são
identificados como tais porque se opunham às interpretações da tradição da
comunidade do autor dos pesharim (comentário), que se viam como os verdadeiros
seguidores de Deus, portanto os Israelitas. Essa identificação de Israel como
bom e seus inimigos bíblicos como os maus, é a suposição central dessa
reaplicação topográfica das Escrituras. A lógica é simples. Como Israel é o
povo de Deus, lugares antagônicos a Israel em sua história são entendidos de
uma perspectiva ética. Para os leitores que seguem essas suposições,
basicamente todos os topônimos das Escrituras são reinterpretados (por exemplo,
Tiro, Ezequiel 28; 12 Tribos de Israel, Ap 7).
Como historiador, o que procuro quando me deparo com tais interpretações
é saber quais são as características do grupo bom e do grupo ruim em discussão.
A partir daí, percebo que o resto é apenas uma questão de combinar os inimigos
do autor com os mocinhos e bandidos bíblicos.
Friday, June 26, 2020
Mudanças de Nome
O texto bíblico
possui em sua narrativa jogos de palavra nítidos em Hebraico. Nome de pessoas e
lugares são modificados de acordo com a situação, como Abrão para Abraão, Jacó
para Israel. Podemos inferir então que o evento histórico foi modificado com o
passar do tempo com objetivos literários?
Os episódios do
passado são preponderantemente trasmitidos de forma oral. Pense na vida de seus
familiares. Quantos deles escreveram diários que foram preservados? Via de
regra, apenas alguns histórias são estruturadas e documentadas em forma
escrita. Histórias são baseadas em (1) testemunhas oculares, (2) reportagens,
testemunha secundária ou tradição oral, (3) reportagem, testemunha secundária
de forma escrita. O próprio ato de escrever, passar do oral para escrita,
requer intencionalidade. Seletividade, organização e estrutura é necessário para
transmitir adequadamente uma mensagem. Assim, o texto bíblico não é diferente.
As suas narrativas são seleções organizadas inteligentemente com o objetivo de
transmitir uma messagem (e.g. João 20:30,31).
Nesse processo de
transmissão a mensagem é moldada para determinados fins. Assim, percebemos no
texto bíblico que nomes de lugares e pessoas evoluem como parte do enredo. A
medida que as coisas mudam, os nomes também mudam. A fonte de água de Jerusalém
outrora chamada Rogel, passa a ser chamada Gihon, mesmo nome de um dos rios do
Éden (Gên 2:13; 2 Cr 32:30; Josué 18:16; 1 Reis 1). Isso possibilitou a
tradição rabínica de identificar Jerusálem como sendo o paraíso de Deus. Outras
vezes, pessoas são nomeadas por suas características físicas ou expectativas
dos pais. Esaú é chamado de Edom (Hebraico – vermelho) por causa da cor
vermelha da lentilha (comida) que ele trocou por sua primogenitura (Gên 25:30).
Curiosamente, Esaú é também descrito como uma crianças cheio de cabelos ruivos
(vermelho), ligando ao nome do território que ele habitaria, Seir (Hebraico –
cabelo; Gen 25:25 e 32:3, 36:8). Jacó, nomeado após sua atitude de engano, tem
seu nome mudado para Israel após lutar com o anjo do Senhor (Gên 32:28).
Seriam essa mudanças
original à narrativa? É difícil de ser dogmático. Pode ser que em determinados
casos, a mudança de nomes fora original quanto que em outras a mudança fora
efetuada editorialmente. Por exemplo, será que Isaque chamava seu primogênito
de Esaú, Edom e Seir? O texto não deixa claro, possivelmente não. Já no caso
dos Hebreus na Babilônia a narrativa do livro de Daniel indica que o rei mudou
seus nomes para vocábulos locais. Faz sentido que eles passaram a ser chamados
por tais nomes Babilônicos (Dan 1:7).
É importante notar
que certos nomes permitiam um certo jogo com palavras tais que os autores usavam
para fins comunicativos. Por exemplo, Em Hebraico o nome de Jesus (Josué)
significa ele salvará. Vemos então em Mateus 1:21 o anjo Gabriel dizendo a
José, “e darás a ele o nome de Jesus (ele salvará), pois ele salvará o
seu povo dos seus pecados.” Outro exemplo é o nome do profeta Daniel, que em
Hebraico significa Deus é meu juíz. Um tema central no livro é o julgamento
divino sobre as nações.
Nem sempre nomes próprios
possuem significados ou estão ligados à mensagem da narrativa, mas quando estão
é importante ao leitor que ler o texto bíblico em traduções, conhecer um pouco
do Hebraico a fim de avaliar melhor as nuâncias literárias ali contidas.
Sunday, June 21, 2020
Em Romanos 11, Paulo se refere à salvação de todo o Israel. Quem são eles?
A lição 19 (Paulo e Romanos: Israelitas e Povo de Deus)
tratou de Romanos 11. No v.26, Paulo se refere à salvação de todo o Israel. Quem
são eles?
Conforme vimos nessa aula do Contexto Judaico do Novo Testamento, em Romanos 11, Paulo argumenta que Deus não rejeitou Israel (v.2) porque
eles rejeitaram Jesus como o Messias (Rm 10: 16-21). Embora Deus considerasse a
não aceitação deles como rebelião. Paulo argumenta que, porque nem todos os Israelitas
aceitaram Jesus como o Messias, apenas alguns ou remanescentes foram escolhidos
pela graça (v.5, 7). Mais tarde, Paulo argumenta que se os Judeus que
rejeitaram Jesus se arrependessem, seriam enxertados na oliveira (v.20, 23).
Então, ele continua dizendo que, mesmo após o endurecimento do coração de
alguns Israelitas, todos seriam salvos por causa de sua eleição por Deus, que é
um presente irrevogável. Eles são salvos pela graça, não por suas obras de
rejeitar temporariamente o Messias (v.28-32).
Isso significa que todos os Israelitas étnicos seriam salvos,
independentemente da crença em Jesus? Primeiramente é importante esclarecer que
Israel é o nome de Jacó, e os Israelitas estritamente falando são os
descedentes étnicos de Jacó/Israel. No entanto, é importante notar que após a
monarquia dividida no período de Roboão e Jeroboão (1 Reis 12-13), as 9 tribos
e ½ ao Norte de são identificadas como reino de Israel, enquanto que as 2
tribos e ½ ao Sul são identificadas como reino de Judá. Assim, o termo
Israelita pode ter ganhado uma nova conotação, os habitates do reino do Norte.
Mesmo que etnicamente os habitantes o reino do sul também fossem Israelitas. Além
disso, sabemos de outras etnias que moravam na terra de Israel e nas narrativas
bíblicas elas não são enfatizadas.
Deve-se levar em conta também, que na época de Paulo, não está claro se a
afiliação tribal estava bem preservada e se os descendentes das 12 tribos
estavam vivos e claramente identificados. Ouvimos no NT referências a algumas
tribos como Levitas, Benjamitas e Judeus. A importância de manter a genealogia
Levita era por causa do sacerdócio. E a genealogia de Judá por causa do reinado
após Davi. Qualquer outra afiliação tribal era politicamente irrelevante. A
preservação da linhagem de Benjamim no caso de Paulo, um Israelita da diáspora,
indica que para muitos isso ainda era importante e digno de manter em
registros.
Em Apocalipse 7, há um registro das 12 tribos de Israel, mas com uma lista
modificada da Torá. As tribos de Dã e Manassés são excluídas e as de Levi e
José estão incluídas. Isso indica o provável caráter simbólico desta lista.
Portanto, ao ler a referência a "todo Israel" em Romanos 11:26, é
necessário considerar que, no século I, alguns Cristãos Judeus estavam se
referindo a Israel como uma representação do povo de Deus, e não
necessariamente à Israelitas étnicos no sentido estrito, como alguém que tem um
DNA de Israel. Não sabemos se todas as tribos necessariamente mantinham
registros de sua genealogia. Este último ponto é especulativo com base na
ausência de evidências, o que, é claro, pode estar errado, mas poderia sugerir
que a essa altura os Judeus não estavam preocupados com uma genealogia estrita
para determinar o status de um Israelita.
Outro ponto a considerar. Se Paulo em Rom 11 estava sugerindo que todos os
Israelitas étnicos seriam salvos, isso aparentemente contradiz o que ele
sugeriu em Rom 2. Lá, ele argumenta que aqueles que crêem em Jesus ao ouvir a
lei seriam justificados, independentemente de sua etnia. Lá, ele também articula
a ideia de que nem todos os Judeus circuncidados ou étnicos são considerados Judeus.
O status judaico, para Paulo, é avaliado não na circuncisão física, mas na
circuncisão do coração (vv.28-29). Isso estaria de acordo com a ideia de
identidade não baseada no DNA físico.
A partir disso, parece possível ver Israel como uma entidade composta por Judeus
e Gentios étnicos que aderiram à fé de Israel e à lei. Na mente de muitos na
antiguidade, o comportamento determinava a genética. Assim, ser um Judeu era
viver como um Judeu. Nesta perspectiva, a referência à salvação de “todo o
Israel” (v.26) poderia estar se referindo àqueles que eventualmente se
alinharam a Deus. De acordo com Ef 2 e Gál 2-3, Judeus e Gentios que criam em
Jesus como o Cristo estavam nEle. Visto que Jesus é filho de Abraão, todos os
que estão em Cristo são herdeiros de Abraão, de acordo com a promessa. Portato,
o crente misticamente se tornava participante de Israel. Parece que, para
Paulo, a identidade Israelita diz respeito à salvação definida à luz da fé em
Jesus. Dessa maneira, aqueles que não eram crentes em Jesus seriam excluídos da
linhagem de Abraão e Israel. O status deles mudaria.
Que tal perspectiva de mudança de status era reconhecida entre os Judeus
durante esse tempo é evidente no esforço dos Fariseus em converter Gentios,
tornando-os "Israelitas". Ouvimos no debate de Jesus com as autoridades
Judaicas a noção de que a etnia espiritual era o que contava (filhos de Deus ou
filhos do maligno - João 8: 31-59; ver também 1 João 3). Filho de Deus é aquele
que Lhe obedece.
Nesta perspectiva, Paulo não está mudando de uma definição étnica para não
étnica (espiritual) do termo no capítulo, uma vez que alguém que está em Cristo
se tornou um Israelita. É a perspectiva do leitor que distingui claramente entre
físico e espiritual que pode ter complicado o entendimento dessa passagem.
Quando é entendido à luz das categorias da antiguidade, faz sentido o que Paulo
explica.
Fontes: Hans K. LaRondelle, O Israel de Deus na
Profecia. Unaspress, 2002.
“Medicine” (Heidi Marx-Wolf) cap.
4 em Late Ancient Knowing. University of California Press, 2015.
Wednesday, June 10, 2020
PENTECOSTES (Shavuot)
Recentemente Israel celebrou Shavuot (Pentecostes), e aproveitei para escrever uma reflexão para os alunos do Israel Institute of Biblical Studies que compartilho abaixo.
Logo após a partida do Egito, Deus ordenou que os Israelitas
separassem dias específicos durante o ano (Heb. moedim) para comemorar
as ações de Deus em seu favor. A Páscoa, no 1º mês, começaria o calendário
deles, lembrando o poderoso ato de Deus ao libertá-los da opressão dos egípcios (Êxodo
12).
“No dia seguinte ao sábado”, após sete semanas completas
(ciclos de sete), após a Páscoa, os Israelitas deveriam celebrar as Primícias (Yom
haBikkurim). Em seguida, os Israelitas deveriam celebrar Pentecostes (Shavuot
- Lv 23: 9-15). Sete semanas após a dedicação dos primeiros grãos brotando do
solo, eles deveriam trazer o grão novamente. Agora o grão estava em sua
maturidade. As celebrações das Primícias e Pentecostes estão entrelaçadas e
ligadas à agricultura da terra de Israel. Ao trazerem os grãos (por exemplo,
cevada, trigo, grão-de-bico) ao Senhor, os Israelitas estariam demonstrando que
suas vida dependiam de Deus. Os grãos são a principal fonte de alimento nas
terras bíblicas, solo que depende da chuva e não de rios para brotar (Dt 11:
10-12). Também haveria uma festa de colheita para os frutos, mas essa ocorreria
no outono, no sétimo mês, durante a celebração das Tendas ou Tabernáculos (Sukkot).
Cinqüenta dias após o Sábado, logicamente sempre caíam no
domingo (primeiro dia da semana). No entanto, uma tradição rabínica, posterior,
sugeriu que o sábado (Lv 23: 11,15) que serve de referência para contar (Heb. omer)
as sete semanas ou quarenta e nove dias, era o dia em que o cordeiro da Páscoa
era consumido, o 15º de Nisã. O significado da palavra sábado aqui seria então
genérico, traduzido como cessação. Sobre isso, nem todos os Israelitas
concordaram. A maioria dos Israelitas (Boetusianos, Manuscritos do Mar Morto -
Essênios, Karaítas, Samaritanos) entendeu que "o Sábado" era o sétimo
dia da semana. Esta última posição é indicada pela referência a “sete setes /
semanas completas” (v.15). Uma semana em Gên 1 começa no domingo e termina no
sábado do sétimo dia. Assim, as duas festas da dedicação do grão (Primícias e
Pentecostes) sempre caíam no primeiro dia da semana.
A tradição rabínica também desenvolveu a ideia de que a dádiva da Torá
acontecera neste dia (Êxodo Rabá 31). Isso foi derivado da passagem em
Êxodo 19:1, que afirma que “no terceiro mês após os Israelitas saírem da terra
do Egito” eles chegaram à região do Sinai. Embora este texto não indique qual
dia do terceiro mês, é sugestivo que a única celebração sagrada de Lev 23 que
caía neste mês fosse o Pentecostes. Não temos nenhuma referência explícita na
Bíblia Hebraica de Israelitas indo ao templo durante esse período, mas pode-se
supor que eles iam. Nos Evangelhos, também não encontramos Jesus indo à
Jerusalém no Pentecostes (Shavuot), pelo menos explicitamente. No
entanto, lemos no Evangelho de João algumas instâncias durante sua vida adulta,
quando Jesus foi à Jerusalém no período de alguns tempos sagrados (veja
abaixo).
Páscoa/Pesach (פסח)
Quando já estava chegando a Páscoa judaica, Jesus subiu a Jerusalém. (João 2:13)
Um festival não identificado
Algum tempo depois, Jesus subiu a Jerusalém para uma festa dos Judeus. (João 5:1)
Tabernáculos/Sukkot (סוכות)
Contudo, depois que os seus irmãos subiram para a festa, ele também subiu, não abertamente, mas em segredo...no último e mais importante dia da festa...(João 7:10, 37)
Dedicação/Hanukkah (חנוכה)
Celebrava-se a festa da Dedicação, em Jerusalém. Era inverno, 23 e Jesus estava no templo, caminhando pelo Pórtico de Salomão. (João 10:22-23)
Páscoa/Pesach (פסח)
Ao se aproximar a Páscoa judaica, muitos foram daquela região para Jerusalém a fim de participarem das purificações cerimoniais antes da Páscoa ... Seis dias antes da Páscoa Jesus chegou a Betânia, onde vivia Lázaro, a quem ressuscitara dos mortos. (João 11:55; 12:1)
Em Lucas 2:41-42, lemos "Todos
os anos seus pais iam a Jerusalém para a festa da Páscoa. Quando ele completou
doze anos de idade, eles subiram à festa, conforme o costume."
De acordo com a Torá (Êxodo 23:14-17), os Israelitas
deveriam comparecer ao santuário pelo menos três vezes ao ano, durante a Páscoa
(Pessach), Pentecostes (Shavuot) e Tabernáculos (Sukkot).
Portanto, a partir daqui, pode-se supor que Jesus, juntamente com sua família, fosse
à Jerusalem durante Pentecostes, bem como em outros tempos sagrados.
Por fim, lemos em Atos 1 que
Jesus foi à Jerusalém precisamente para esta ocasião, mas desta vez, Jesus
parte (para o céu) antes do festival. Há uma tradição que vê a ascensão de
Jesus como a razão do derramamento do Espírito no capítulo 2. À luz dos rituais
do santuário e da epístola aos Hebreus, alguns dizem que quando Jesus subiu ao
céu, ele foi ungido sacerdote, e o que Jesus recebeu no céu foi confirmado com
Seus seguidores na terra com a unção do Espírito Santo. É interessante notar
que, na tradição rabínica, Pentecostes é o dia da revelação de Deus no Monte.
Sinai com fogo, semelhante ao que acontece com Atos 2 quando labaredas são
visualizadas na sala com os discípulos.
Friday, May 22, 2020
Qual a diferença na Bíblia entre animais e homens visto que ambos são
seres viventes (nefesh hayah)?
Em Gênesis 1 lemos no relato da criação várias semelhanças e diferenças
entre os animais e os seres humanos.
Semelhanças:
Chamados – nefesh hayah; eles movem; são frutíferos e se
multiplicam; mesma dieta vegetariana.
Diferenças:
Humanidade criado a imagem de Deus x Os animais cada um segundo sua
espécie
O clímax do relato que é elaborado no cap.2 é a criação da humanidade.
Os homens deveriam subjulgar os animais (v.28)
Assim, já nos primeiros capítulos da Bíblia é diferenciado os seres
vivos indicando o status especial da humanidade. No final do capítulo 3, após a
desobediência da humanidade, a criação é amaldiçoada (3:14,17) e inicia-se os
rituais de sacrífio, com a morte de cetos animais (Gen 4, 8). Para Noé é
repetido o que foi dido à humanidade em Gên 1, que as criaturas da terra seriam
submissas à humanidade (9:1-2) com o agravante agora que a dieta poderia
incluir animais. No entanto, Deus proibe a ingestão de sangue por conter a vida
do animal. Basta ao homem tirar a vida (nefesh), não comê-la. Quanto ao
destino de ambos após a morte, no livro de Eclesiastes é mencionado que ambos
vão ao mesmo lugar, do pó vieram e ao pó retornam (3:18-21).
Após o dilúvio, certos animais se comportam de maneira dócil e são ou
irrelevantes na narrativa ou usados pelos homens como meio de transporte,
alimento ou sacrifício. Em outras ocassiões, no entanto, os animais se opõem aos
seres humanos e entram em conflito com eles, como no caso de Sansão (Juizes 14:8),
Davi (1 Sam 17:34; Sal 17:12). Eles também aparecem como devoradores dos homens
(Jezabel - 1 Reis 21:23-24; 2 Reis 9:10;
meninos rebeldes - 2 Reis 2:24). Eles também são usados por Deus para julgar a
impiedada humana (e.g. pragas no Egito; maldições da aliança em Deut 28:26, 38,
42; Joel 2:25).
Em alguns casos estranhos, os animais são contrastados com a impiedade
ou inabilidade humana em reconhecerem o poder divino (e.g. Balaão - Núm 22:27-31;
o falso profeta - 1 Reis 13:28). Essa inimizade na natureza entre homens e
animais, na visão profética de Isaías, seria
finalmente terminada com a restauração da lei divina. É o retorno ao Éden em
Gênesis 1 e 2 onde ambos são vegetarianos e vivem em harmonia.
“O lobo viverá com o cordeiro,
o leopardo se deitará com o bode,o
bezerro, o leão e o novilho gordo pastarão juntos;e
uma criança os guiará.7 A vaca
se alimentará com o urso, seus filhotes se deitarão juntos,e
o leão comerá palha como o boi.8 A
criancinha brincará perto do esconderijo da cobra,a
criança colocará a mão no ninho da víbora.9 Ninguém
fará nenhum mal, nem destruirá coisa algumaem
todo o meu santo monte, pois a terra se encherádo
conhecimento do Senhor como as águas cobrem o mar.
Naquele dia as nações buscarão a Raiz de Jessé, que será como uma bandeira para os povos, e o seu lugar de descanso será glorioso. (Isa 11:6-10)
mas o pó será a comida da serpente.
Ninguém fará nem mal nem destruição
em todo o meu santo monte”,
diz o Senhor.” (Isa 65:25)
Wednesday, April 8, 2020
Reflexões sobre a Páscoa
Shalom!
É o feriado de Pessach
(Páscoa) e da Hag HaMatzot (Semana dos Pães Asmos). Aproveito
esta oportunidade para refletir sobre o significado desses tempos sagrados da
Páscoa e da semana dos Pães Asmos. Nos próximos dias, leia os 18 primeiros
capítulos do livro de Êxodo para apreciar o motivo da temporada. Abaixo algumas
das minhas reflexões sobre isso.
No livro
de Êxodo, a história começa com os Israelitas em escravidão depois que um
governante perverso (Faraó) chegou ao local que ignorou o papel de José na
libertação agrícola do Egito durante a seca. Os filhos de Jacó, que haviam ido
ao Egito, escapando da esterilidade, agora se encontravam em uma inesperada
situação de escravidão. Eles clamam a Deus, mas parece que Deus os havia
abandonado. Mas apenas apareceu. As damas de Israel se tornam férteis e os Israelitas
produzem tantos filhos que até o faraó é ameaçado. Outra circunstância triste,
no entanto, está a caminho. Os bebês são executados pelos soldados egípcios.
Parece que a esterilidade era o destino deles. Enquanto isso, Deus resgata o
bebê Moisés, que serviria como um sinal do que Ele faria com Seu filho Israel.
Novamente,
eventos infelizes aconteceram e Moisés teve que deixar o Egito. Por quarenta
anos, os Israelitas vivem em escravidão e Moisés no deserto, uma terra árida.
Talvez seja um sinal da amnésia e do abandono de Deus. Mas apenas pareceu. No
devido tempo, Deus aparece. Moisés é enviado ao Faraó com a mensagem:
"Deixe meu povo ir!" Não seria assim tão fácil. Depois dos sinais de
Moisés transformando a água em sangue e um pau em uma cobra, parece que o Faraó
ficaria convencido. Mas apenas pareceu. Foram necessárias dez pragas e a morte
dos primogênitos dos egípcios para quebrar a teimosia do faraó e as dúvidas dos
Israelitas.
Na
última manifestação do poder de Deus no Egito, é ordenado aos Israelitas que
eles fizessem uma refeição especial enquanto a morte pairava do lado de fora de
suas casas. O anjo do SENHOR tiraria a vida do primogênito daqueles que não
seguissem as detalhadas instruções. Um cordeiro deveria ser abatido e seu
sangue colocado em seus batentes de porta para apagar a memória da escravidão e
cultura egípcias, ao mesmo tempo em que fornecia uma nova identidade aos
participantes da refeição. Naquela noite, eles seriam entregues.
Não havia
tempo para levedar o pão. Eles comeriam bolachas sem fermento naquela noite,
com cordeiro assado e ervas amargas. Eu posso imaginar a angústia e o alívio
daquela noite fatídica. Enquanto eles comiam, a morte passava sobre os salvos
pelo sangue do cordeiro. Mas a morte entrou nas casas daqueles que ignoraram o
convite da misericórdia. Os prantos dos pais egípcios quebram o silêncio. É o
clamor de incrédulos no que acabara de acontecer dentro de suas casas, por
causa do excesso de confiança de seu líder.
Era
primavera no Egito. Aquele era o tempo da nova vida. Mas apenas pareceu. A vida
nunca mais seria a mesma. Quando as colheitas deveriam crescer, a terra foi
devastada. Havia pouco que o Egito pudesse oferecer. Os Israelitas tiveram que
procurar refúgio em outra terra, a prometida que fluía com leite e mel. Mas as
expectativas falharam novamente. Eles primeiro tiveram que passar pelo deserto.
Lá para ser alimentado por Deus. Embora pareça que a experiência da Páscoa foi
o fim, apenas pareceu assim. A décima praga foi apenas o começo.
Um reinício
para um grupo de ex-escravos. Para aqueles Israelitas, a liberdade era
maravilhosamente estranha. Eles tiveram que desaprender muitas coisas e
aprender outras, se quisessem se afastar do Egito. A refeição da Páscoa se
tornaria um lembrete das aparências fracassadas do poder humano e do momento
perfeito de Deus.
Como
comemoramos hoje a Páscoa, enquanto a morte paira fora com o Covid-19, não
deixe que as aparências de desespero o assolem. Deus está no controle da
história. Confie nele, ouça seus comandos e, no devido tempo, seremos também
libertos.
“Se vocês derem
atenção ao Senhor, o seu Deus, e
fizerem o que ele aprova, se derem ouvidos aos seus mandamentos e obedecerem a
todos os seus decretos, não trarei sobre vocês nenhuma das doenças que eu
trouxe sobre os egípcios, pois eu sou o Senhor que os cura.” (Êxodo 15:26)
Subscribe to:
Posts (Atom)